Um Baille Em Louzada
[…] No mundo fantástico, que se vive nos bailles, não deve comparecer só gente moça: os velhos dão-lhe um certo colorido; são espelhos que reflectem muita desilusão; são livros de filosophia que obrigão as donzellas a scismar.
Introduzido n’uma sala de baille de uma das primeiras casas de Louzada, depois de um leve toque de mão e de uma reverencia profunda aos donos da casa, passei revista ás flores animadas que enfeitavam a sala convertida em mimoso jardim.
D’ entre as tres gentis camelias do mesmo tronco destacava-se, e como pendia, a violeta, recortada sobre um dos braços de uma poltrona verde; os raios de meiguice e brandura, que fulgiao entre suas espessas pestanas d’ebano, denunciam a pureza de uma alma ingénua. Nao devia amargurar-se a sensitiva por ver alguém mirar-se em outras flores: nunca faltarão vassalos a quem reina pelo espírito e pelo sentimento. Talvez se quizera antes sozinha na encosta do seu valhe do que encontrar-se entre a multidão, a madre-silva: percorria com a vista todos os horisontes, mas os horisontes não lhe restituíam o satélite que um negro elipse fizera desaparecer. Estava triste mas sempre linda.
Acabada a primeira contra – dança, retirei-me para a casa aonde se fumava, e acendi um charuto. Estavam alli alguns pontos que não trajavam em rigor. Nas aldeas a festas de etiquetas só vai de casaca quem a tem, quem a não tem, os padres e os músicos vão de casaco.
A um canto do gabinete jogava-se um wisth tumultuário que divertia os circunstantes. Um dos quatro parceiros jogava apenas com cincoenta e duas cartas. Provocava questões e improvisava travessuras a um longo cachimbo, que segurava, ora a um ora a outro canto da boca, para se fazer senhor das cartas dos dois parceiros contrários, examinava em seguida as suas e depois equação fácil lhe era adivinhar as tres restantes do parceiro que tina em frente. Nenhum dos quatros; ainda que de diferentes escholas, jogava movido pelo interesse: mas era tão forte a vontade que o das cincoenta e duas de mostrar-se superior aos outros, que apesar do partido do partido de jogar com as cartas todas, renunciava todas as vezes que lhe convinha, para que ninguém lhe disputasse as honras de mestre.
O Capellão da casa era homem de ideas, mas arriscava-se quem lh’as contrariasse. Falou-me do concillio ecuménico, da desarmotisação dos passaes e da inflibilidade do Papa: a gesticulação, porém, com que acompanhava o seu discursar, era tão vehemente, tão descarregada á queima roupa, que me poz em retirada com medo de ficar cego. As unhas das mãos, com que me aggredia, eram tão aguçadas, que sem offensa dos códigos e regulamentos de policia deviam considerar-se como armas prohibidas.
Entrei de novo na casa do baile: dava-se sinal para uma walsa. Já que as minhas palavras gélidas não podiam ter echo no coração da violeta, tive a sinistra idéa de fazer-lhe andar a cabeça á roda – walsando -. Quando ella me dirigia para a tirar como parceira, sustive-me em meio do caminho, um traste luxuoso que guarnecia uma das paredes da sala: era um espelho que reflectia os meus cabelos brancos.
Procurei uma papoula. Lá estava meia à sombra de um magnífico jarrão de camélias. Tinha descalçado a mão esquerda e pareceu-me que ao levantar o leque que talvez a rede deixara cahir sobre um tapete. Sorvia uma pitada de meio grosso. Magra e angulosa offerecia contrastes salientes: o nariz aquilino, os olhos rasgados e vivos e o pé pequeníssimo tinha fumos aristocráticos; as faces cheias e rubicundas e a mão larga e o polegar excessivamente prolongado, eram d’ uma bunideira encartada,
Havia meia hora que tinha chegado d sua quinta das Caldas, aonde reside, e já distiguia os vestidos novos dos transformados, conhecia o nome e o preço das fazendas, das rendas e das fitas, o número de metros que em tudo isso se tinham gasto, sabia o nome das modistas que tinham fantasiado e executado tanta elegância, em que dia chegaram do Porto todos os enfeites, e até a gratificação que se tinha dado ás recoveiras.
Apercebendo-se que eu com a resignação do martyr escutava silencioso a tirada das suas curiosidades:
- U. ainda prefere uma noite de baille a uma noite de theatro?
- Bailles e theatros são hoje os meus vícios.
- Também gosto muito.
- De charutos?
- Não! de bailles.
- O que é admirável é como estas famílias, que vivem em grandes distancias, se reúnem durante o inverno e se apresentam com tão boas toilletes!
- É o progresso. Afastados vão os tempos em que íamos ao theatro de Unhão, para onde não havia caminho nem carreira, passar uma noite inteira cheia de incommodos. São hoje outros os tempos. Não viu no pateo seis carruagens afora os char – à – banes? É o que fazem as estradas e as novas ideas que dão ás aldeãs fora de cidade. Não vê aquelle galope? É o vapor, a electricidade: as walsas do nosso tempo eram o carroção.
Para não adormecer fui conversar e fumar com os meus amigos, retirando-me depois de um opíparo almoço, penhorado pelas maneiras distinctas e continuados obséquios que prodigalisaram õs donos da casa.
Gazeta de Penafiel, quarta – feira, 02 de Fevereiro de 1870, Nº 9, p. 1
X
a igreja de são vicente de boim
a paróquia de boim: breve enquadramento
anthero pacheco da silva moreira
caminho _de_ ferro_ de_ penafiel _á_ lix
cargos e profissões dos proprietários de
casamento - joaquim da silva netto com d
i congresso internacional da rota do rom
igreja paroquial de cristelos / igreja d
igreja paroquial de figueiras / igreja d
igreja: stº estevão de barrosas
iii jornadas de história local
www.lousada-digital.com/turismo/patrimonio
Origem historica do concelho de lousada
blogs de interesse
Instituto Português do Património Português